– Palavra Comum: Que é para ti a economia?
– David Peón: Desde o ponto de vista pessoal, uma paixão reencontrada. Devo quiçá pedir desculpas por dizer isto, mas o certo é que a crise do 2008 foi para mim muito estimulante no plano intelectual, e uma oportunidade de voltar ao estudo de uma disciplina que até então apenas era uma sucessão de títulos acadêmicos que abriam a porta ao trabalho no setor privado.
Desde o ponto de vista geral, de como entendo eu a economia, eu vejo as ciências sociais como um tudo: economia é o nome que lhe dão a relação entre pessoas quando falamos de dinheiro e produção de bens e serviços, mas para mim não é possível desligar a economia da história (por que as relações econômicas são hoje as que são), da sociologia e política (as relações assimétricas de poder entre pessoas que a economia estabelece), da psicologia (individual e coletiva, particularmente nos mercados financeiros), etc.
– Palavra Comum: Que perspectivas são hegemônicas na Economia hoje, em geral, e como influem nas vidas das maiorias sociais?
– David Peón: Claramente, tudo o contrário do que apontei antes. O problema não é tanto que o neoliberalismo, a desregulação dos mercados e a privatização do público sejam a visão dominante em muitas universidades ou de muitos economistas, mas os recursos com que o poder econômico conta para que tudo fique assim (financiamento, avaliações, incentivos, círculos e publicações acadêmicas…).
– Palavra Comum: Que características consideras relevantes da economia em Galiza hoje? Para onde pode e deveria transitar (e com que outros espaços poderia interatuar -por ex., Portugal, etc.-)?
– David Peón: A demografia é a questão central. Primeiro como sintoma, sintoma de uma sociedade e uma economia que não funcionam, e os muitos problemas econômicos que há detrás. Mas também como problema econômico, uma demanda estrutural contrativa que faz, desde o ponto de vista capitalista, não atrativo investir aqui –o qual, sem políticas públicas que o corrijam, só vai fazer as coisas pior, sobretudo para os jovens e o rural.
A Galiza deveria ocupar os espaços onde possui uma centralidade. Ante o discurso da Galiza como periferia –que só aponta que quem nos vê como tal é quem toma as decisões longe de aqui-, a Galiza é central no Atlântico, como fachada Atlântica de Europa. Ao tempo que é central na integração econômica na Eurorregião com Portugal Norte, deve olhar cara as nações celtas do Atlântico, cara o tráfico marítimo do Atlântico, deve olhar cara os países da América Latina, onde as línguas mas também a nossa emigração são potência, e por último, deve apostar -entre outros- por setores onde ser periferia geográfica da Espanha não seja impedimento: na Galiza, desenvolvimento da economia rural e de proximidade, assim como da economia de assistência (idosos, sanidade, etc.); na economia global, desenvolvimento do capital humano em setores como a energia, informática, telecomunicações, e outros.
– Palavra Comum: Que perspectiva tens sobre a língua galega e as suas relações com a Lusofonia (e com o resto do mundo)?
– David Peón: Disto tenho falado muito com reintegracionistas, e minha visão é clara. Primeiro, a Galiza do século XXI deve falar galego e espanhol. Mas o galego deve ser a porta ao português e a lusofonia. Então, quanto á normativa, acho que durante uma ou duas gerações a aposta deve ser a do Instituto da Lingua Galega (ILG) por ser a atual, mas introduzir o ensino do português na escola através da matéria de galego, de maneira que todos os rapazes galegos sejam 100% competentes em português ao rematar o ensino. Então, após duas gerações, uma sociedade perfeitamente competente em galego ILG e em português que escolha: seguir com o padrão ILG por questões identitárias (a opção luxemburguesa, por exemplo), ou integrar-se no padrão internacional, por questões utilitárias (a opção flamenga, por exemplo).
– Palavra Comum: Fala-nos de como seria -e que pode existir dela já agora- da tua Galiza imaginária…
– David Peón: A minha Galiza imaginária é dona de si mesma, orgulhosa da sua terra e da sua gente, vive em liberdade e prosperamente, e chega desde o Cantábrico até o Mondego, como mínimo…
Ela existe já além Minho.
NOTA: esta é a web do autor.