Antom laia lópez (Melide, 1956). Mestre aposentado, nado en Melide mas podia ser en qualquer outro lugar onde aninhasse o orvalho da manhã, namorado das leituras, da justiça e da poesía, os recordos, a rua e o decorrer das águas, os filhos e o salitre. Ten publicado os poemários: No balouçar do vento, Nas margens do tempo, No cinzel livre das securas. Colaborado en revistas de poesia e diversas antologias tanto na Galiza como em Portugal. Estes 8 poemas fazem parte do livro “E na gaveta um fardel de palavras” editado pela Urutau.
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SE EU SOUBESSE A PALAVRA
a palavra que nasce no miolo mesminho da vida que habito a que
apanho dos gromos e das pugas
que es- tarricam vida
a que por vezes abro e aprofundo e bebo e sugo
loucamente a que mondo como se fosse umha noz
que na vega no salitre a que bico com os meus lábios cortados
pola invernia do frio a que des-visto para fitar
teus seios de leite amazucado
a que me circunda como a amante que sempre me espera
a palavra, a palavra em corpo desnudo-essa-na que deito
a palavra no zig-zag da luxúria como cóbrega nos tornazelos a palavra,
mistura de sangue e barro-lama pe-gada sobre a pel
a palavra que arestora me chama tolo
e louco, barco perdido
a palavra, esse discorrer dos fonemas no epicentro
dos sexos e bate com as silabas nas curvas infinitas
dos canles molhados essa, tabú de desejos,
que se leva nas linguas todos os segundos
abençoada no verbo em coito nos que
as águas se abraçam orgasmo de nuvens chocando como feras selvagens
a palavra in versus silêncios como lobas nas ilhas a palavra
a palavra a palavra que subjaz no fondo
como cadáveres
*
QUEM MEUS MEXACANS QUE PÁSSAROS NAVEGADES
quen meus mexacans
nas formas voláteis dos poemas que sobrevoam no espaço
como lenes partículas que voades entre o húmido dos olhos
Quen como dentes de leom ides vogando entre os céus que cobrem
de fiínhos o devagar das trasparências que sostemos entre desejos que escorregam
livres como rulas polos ventos
Quem como dentóns vides ás janelas que se abrem plenas
nestas manhancinhas de cheirumes nas que se alviscam mil romances
amorados nos lábios das cervas entre a folhagem
Quem dulcamaras tapades em lençois de branco linho os corpos dos amantes
que se entrelaçam como solitários elos dumha colcha
na que se tecerom tantos amores em horas
Quem tarrelas das noites que abrolhastes salivas nas bocas
como mesturas de sal e lua entre os peitos desnudados
nos encontros dumha luxúria de volúpias aquecida num plenismo
Quem vulvárias livres voando sobre o livre vento dos menceres
apanhastes do prazer a raíz do orvalho que sementou de azul
o branco cobertor nos que deitamos como espadas ceives
Quem vos desfez, formas inconsistentes que esvoades polos anceios c
omo travesias dum vento no desarvorar das danças
QUEM ?
*
COUSAS PEQUENINHAS
às vezes numa pequena coisa pode-se encontrar
todas as coisas grandes da vida não é preciso muito,
basta olhar
Ondjaki
Basta olhar as miradas das crianças o peitear-se dos cabelos livres
a água em verde azul do mar a luz entrar tenue polas janelinhas
o canto do grilo no solpor do dia o frescor das pingas nos abrentes
o galo a cantarejar no cimo do poleiro o recordo persistente da beilarota
as palavras primeiras dos filhos o sorriso dos avós a fitar em nós
o voo da libelinha derriba dos ríos as flores a nascer nas roseiras
a primeira cereija do verão o corpo a achegar-se ao corpo
o beijo dos paporoibos nos ninhos
os ovos das merlas a criar merlinhas
as olhadas infinitas do tempo por chegar o amor que se sente nos sonhos
das pequenas cousas que se tocam a liberdade dos povos a ser livres
como as barquinhas de papel a vogar rio abaixo na busca das concas que tenhem um peirao de rosas avermelhadas
basta coas pequenas cousas das nenas que calcetam mundos de astros pequeninas cousas a tocar-se nos lábios
*
CASTELO DE NAIPES
Quando o vento sopra, é porque tá na hora
(cita dum papaventos a sorrir na tarde)
quando o vento sopra voam as estrelas nos lábios de cores
quando o vento sopra tornan-se os céus de amarelos e no rebulir dos dedos as formigas desenham um castelo de naipes
quando o vento sopra nos dedos deitam os corpos num castelo de
n a v e s
que soçobram derriba mesmo da escuma
(Parece mentira, mas ri o papaventos na tarde)
*
SECUNDINO, MIGUEL E FERNANDO
falávamos, nós os tres-caminho da camposa
ou do rio entre rostos de brincos e sorrisos,
de mil cousas
mesmo nós, falávamos entre o calor do sol
que nos petava nos lombos
como quem se contam continhos
como quem escoitávamos a filarmónica:
esses sons nos teus lábios
secundino-claudias das hortas-maduradas
Miguel Prado Rodriguez na rua, na nossa rua,
co voar laranja dos seráns
com aquelas pelotinhas de Gorila-petando-lhe
na parede de areia e cal
Olhamos o retrato Adolfo, Manolito ou Arturo
nessa pedra granito nas arelas
duns bicos de mulher
como cuncas de caldo
Eu recordo-devo recordar para nom esquencer-
Baixa a névoa e as nais frotando nas sabas
naquel lavadoiro de murmulhos-remoinhos
de roupas lavadas –
Secundino Blanco López
— aqueles ninhos sobre salgueiros e entre silveiras de
céus como o balanceo das lanchas no Sam Roque —
sobem, descem luzes nas noites da noite
nós-os tres-da estreita de sol e chuva-galhardetes a
cores e uns pinceis abrochando no abotoar das esperas-nós:
os tres
caminho de Furelos a deitar-nos
sobre os astros-filhos de Carme-Antónia e Rosário
*
GRITO
o grito é a suma de silêncios
abrem os ouriços regañando nos olhos a humidade das
pingas neste meu outono de pisadas sobre as folhas
que esvoam secas
este meu outono de lume entre os meus dedos que
aterecem vida para que os amarelos tapicem os
caminhos de almofadas moles
e soem entre os oidos o chirlar manselinho dos
pássaros nos abrentes para que os fungos revivam
entre as ervas e se desfagam nas bocas
como esses liquens que apousam no meu leito neste
decorrer de horas quando as cores me invadem
o meu interior inteiramente de nostálgia
e nestas tardes que se acurtam como noites nas que
mora o meu corpo entre tantos recordos de uvas
apanhadas sobre as congostras molhadas
adormecem as cóbregas em baixo dos furados nas que
desabitam mornas e esvoam polo ar as folhas secas dos
castinheiros buscando um abrigo que serva aos meus
pés como esses zocos que caminharom nas deshoras
*
ENTRE O DIA E A NOITE
A miña casa está entre o día e o soño.
e. veiga
A miña casa está entre o dia e o soño
a casa,ela que tem sempre os olhos ,como lámpadas
na que permanece o cheiro a resina das távoas
O canto dos grilos e a selha no alzadeiro coa auga
da fonte dos quatro canhos,essas primaveras
mimoseiras
No lusco-fusco o petar das pingueiras na janela
rota,e o ar do Bozelo em chegando como umha
bolboretinha maina
O escano e o talho onde sempre leio a vida na palma da mão
como quem le nas historias de Zipi e Zape – essas historietas
A casa e sol por detrás da capela do santo roque-eilí
onde o orvalho molhava nos sapatinhos de gorila-pingotas
Entre o dia e a noite-entre os dedos-entre a Rua Sol
e o cercio as máquinas esvirutando nas madeiras o serrim das cuzinhas
Entre o vinho de Chantada e o toucinho com pam,
brinquedos de paus por todos os cornelhos, chamando-me.
Impermeáveis e duradeiros – aí estám -na casa,
onde onte um guá era o lume que desentumecia os cotelos
das nossas maucinhas de nenos maucinhas de nenos
a desgastar-se fregando-se esquerda a dereita, dereita à esquerda,
para pilhar tentos a achincar às bolas
*
AMO E DETESTO
Detesto o saudismo de bágoas frias.
Detesto a filosofía esotérica.
Detesto a Igreja, os militares, os romances do Coelho.
Detesto a Wagner, o Cristo-Rei, a Eliza- beth Taylor,
a Frank Sinatra, por mafioso, à Banca, aos assassinos de luva branca, a Trump.
Detesto a aquela senhora de ferro e a aquel ex-presidente de USA des- tenhido.
A Franco, a Salazar e a todos os fascistas, aos novos filósofos franceses.
A morrinha como jeito de matar-nos.
Gosto de E.de Andrade e do Torga, do Zeca, de Faus- to.
de Suso Vaamonde, amo às poetas das lareiras e do salitre.
Olga Novo ou Marta do mar em Compostela.
Pólvora e magnolias. Virgilio Ferrreira e Herberto Hel- der. Passolini e Alfonso Sastre.
Escoito a Lluis Llach e Luis Pastor.
Gosto dos recordos das sopas da minha avoa Concha,
do cantar do cuco, das amoras das silveiras, da poe- sía de Pexegueiro.
Dos brinquedos de paucinhos, dos trompos, de brincar à panda.
Saltaricar com um aro a onde vas Lelo coa arado de ferro de amanhã cedo.
Andar nos caminhos e o soar das buguinas-medre o mar
nessas mans de salitre -a vara de biduiero, as xerfas e o colo de Quicolo.
Amor de tangarina.Seios desnu- dos apertados no dedilhar das luas.
Cortázar e Manuel Puig. Manuel Scorza.
Detesto a Aznar, aos sionistas, a Berlusconi, a Manuel Fraga,
aos juices da injustiça, aos e às legisladoras das patranhas
e dos roubos-às elétricas-aos reis de espingardas de ouro
e aos palacetes de cristal onde se descuartiçam os olhos.
Detesto a Merkel e ao neoliberalismo — esse nazismo de carautas liberais.
Amo a Bertol Brecht e os voos dos pássaros carpinteiros.
Detesto tantas coisas que por isso amo tantas outras.
Mesmo por isso gosto de sestear num escano de castinheiro.
De ollhar o lume nas lareiras enquanto o carrelo da Mouchinha Branca
(essa gatinha fiel que de fite em fite me mirava).
Por muitas coisas detesto o que detesto e amo a quem amo,
por isso tomo o sol, mentras o tomo espero.
Do Bozelo ao Pía-Pássaro mil rebolas nos Taros-tessos cumes das esperas.
Brilham as estrelas em Timor como
o deitar entre cobertores de farrapos
Detesto o saber infinito de borges por obviar a quen
dende o ceo adetravan no mar.
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