Há países, e povos que os habitam, que sofreram ao longo da História castigos imerecidos. A Galiza e os galegos são desses. A queda da Galiza nas mãos leonesas primeiramente e depois castelhanas fez com que a língua excelsa da poesia medieval ibérica ficasse reduzida a triste patois. Quinhentos anos passariam para que aparecesse em terra galega um governo próprio com autonomia suficiente como para reivindicar o idioma patrimonial e poder pô-lo no sítio que lhe corresponderia.
De tudo isto já se tem falado muito, mesmos nas páginas electrónicas da Palavra Comum. Acrescentar-se-á que foi um erro o modelo escolhido por mentes pacatas de sujeitinhos cá mencionados anteriormente; e que para muitos há suspeita de ter sido escolhido com maldade, para acabar de converter a língua galega em lama do chão. Sucessivos governos (desgovernos) do Partido Popular da Galiza, servo arrastado do PP madrileno, com aquela política (impolítica) do “bilinguismo harmónico” levaram o galego ao pior dos estados B dum sistema diglóssico: aquele em que a língua B não já aceita incrustações da A mas é tradução da A.
Para maior desgraça do galego, no seu caso há uma língua A’, que é o português. E, para elevarmos o problema à máxima potência, há o fato de serem o galaico-português e o castelhano línguas muito semelhantes. Tudo conduz a uma imensa confusão que convida ao abandono da língua mais débil. Logo de séculos de negação e mofa de quanto fosse português, hoje na Espanha só os nacionalistas mais ignorantes negam a importância global do idioma luso-africano-brasileiro. Eis logo que haja na Galiza pessoas a pensar que o prático seria esquecer o galego e trocá-lo pelo português.
A consciência nacional dos galegos, bombardeados pelos média madrilenos, é pouca; e pouquíssima a sua vontade de luta pelo idioma que lhes deu topónimos e apelidos; que lhes fez ser diferentes. Por isso o que segue é uma quimera que o autor desta notinha não pode deixar de expor:
Se na Galiza houvesse vontade de colocar as coisas nos seus sítios, o sistema educativo deveria incluir o Latim, o Galego, o Português e o Castelhano, não como matérias afastadas e desconectadas mas como um elemento contínuo que fosse criando nas mentes dos estudantes a consciência de que o galego é a fala natural, filha do latim; o português, uma deriva da fala própria; e o castelhano, uma língua consanguínea.
A língua de instalação dos meninos, na que aprendessem as letras deveria ser o galego, já com avisos e referências ao português. Depois viria o castelhano, com as dicas para o diferenciar do galego e evitar interferências de vulto. Sem nunca ter perdido a chamada amorosa para o português, este haveria de entrar formalmente nos curricula quando os pequenos já estiverem prontos para as línguas que não têm presença contínua nas suas vidas.
Esse seria também o momento do latim, e dos seminários sistemáticos sobre as línguas ibéricas, a sua origem comum e as diferenças surgidas nelas a partir da língua mãe, a dos colonizadores romanos.
Não seria decente fechar esta coluna sem referência à forma visual do galego, a sua grafia. Para quem isto escreve, rotundamente, a ótima seria a mais próxima à do português, por razões de história e de economia de códigos.
Também não seria próprio deixar de comentar que, logo de se aprenderem duas ou três línguas romances, a terceira… Sim, o francês seria fácil e é idioma muito produtivo.
E o inglês? No comment.
E não seria investimento de mais em tanto idioma? Não ficariam fora de programa matérias fundamentais?
A resposta é que, para a gente prosperar na vida, deve estar segura da sua pátria profunda, a fala. Para poder aprender de todo necessita-se conhecer bem as línguas em que a vida obriga a um a pensar e sentir… além, por suposto da linguagem matemática. A excelência no domínio dos códigos de expressão leva, naturalmente, à entrada em qualquer área do conhecimento.
NOTA: A foto do autor pertence à Fototeca da AELG.
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