CONDIÇÃO DE ABRIL
I
Confio o pé despido percebendo o roce da água.
O contraste acelera o ritmo cardíaco,
aumenta a temperatura nas têmporas.
*
II
A tua pele revela-se quente à minha língua.
*
III
Conhecer abril.
Compreender abril sem encerrar abril.
Aceitar abril.
Viver como ele vive.
*
IV
Abraço a luz ténue.
Diviso a subtil forma duma mamila.
Devera considerá-la como um sintoma.
Permaneço no meu lugar para não perturbar o sossego
ainda quando aguardas o contrario.
Evito mirar a luz.
Evito perder de vista abril.
*
V
Embato com a tua frustração.
Escuto sem compreender.
Aquele momento que aguardavas mágico
expirou.
A luz volve iluminar abril.
Cobre-se a tua mamila.
Apagas-te.
*
VI
Existo porque vejo abril,
porque o respiro,
porque o exalo.
O silencio é abril.
*
VII
Forte e débil
Abril é vulnerável.
Foge de qualquer condição além da essência.
Não tem género, nome ou definição conhecida.
Anátema pela insubmissão ás formas, ás tradições.
Conspícuo pelos feitos.
Abril é uma forma que se insinua na penumbra,
uma ideia.
Leva implícita a utopia, a palavra justa,
o alento.
Abril é uma presença tácita.
*
VIII
Abril é uma multidão.
Perco-me entre os corpos de abril
sem encontrar uma única saída.
É uma demanda,
é uma sucessão de perguntas,
abril é uma e todas as respostas.
*
IX
Procuro em silencio, como quando a cidade cala.
A sombra dos pés ao meio dia. A pesada carga do asfalto. Mais uma vez os passos.
―Não acredito nas barreiras! ―Os muros, os prédios ecoam.
Lá, do outro lado, uma silhueta que acompanha as horas.
O mundo é apenas uma massa sem resposta.
*
X
Divido as porções maiores e petisco.
Os instantes que se detenham abalados pela língua, como a fruta que deposita delicadamente os sabores em cada recetáculo sensível, identificando-os um a um.
Existindo neles abril, todo e parte.
*
XI
Pego no último copo percebendo como o vinho abala no interior.
Movo a mão descrevendo um círculo antes de pressionar com o vidro os lábios. Aguardo.
Falas-me. Não te escuto. Finjo que sim para que continues a te mover de forma natural. Passeias as cuecas mais velhas e moves o cu enquanto sorris para mim, que imito o gesto sem compreender.
É abril quem se insinua ao passar-me a mão pelo ombro. Quem troca um desejo com a mirada. Quem me leva. É abril quem murmura. Forte e fraco.
Abril. A forma das mãos nas superfícies.
Sonâmbulo abril. A resposta a qualquer questão. Pergunta e resposta no mesmo abril.
As falanges sobre o corpo. As palavras. Abril.
*
Foto: Alfredo J. Ferreiro Salgueiro (2019).
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