Da banalidade ao profundo
Tratado intratável da frontalidade
…quando perdi as letras todas sem saber onde as deixar
temi perder a capacidade de expressão necessária à socialização.
Facilmente percebi que as deixei na academia,
estavam entre uma mesa de um colega e a carteira de um senhor professor…
não tinha intenção de me matricular só para reaver as letras
para seguir carreira, para doutrinar as gerações vindouras… e, por isso
cavalguei
rumo ao indizível. Confesso que no silêncio encontrei algo de novo
uma apatia saudável, um ligeiro gosto niilista sugerido por um melhor amigo,
a poesia nunca editada de um outro irmão, a verdade, a transparência.
Lamento, mas eu não quero os vossos livros, nem as vossas cadeiras,
Nem os vossos tronos
nem as vossas capitalizações a cada início de frase.
…não lamento nada, perdão, não lamento absolutamente nada
só no silêncio e na clausura encontrei um cavalo de batalha contra a banalidade
e, apesar de apreciar no vulgar a beleza do comum, encontrei a paz de espírito numa frase tão simples
‘que se foda’ eu não lamento nada perder as letras
Não tenho pena, nem me revisto de penas, por não ter de preparar frases e palmadas nas costas
Não tenho qualquer arrependimento por negar a condição do senhor que partilha parte do conhecimento apenas, qual ser agraciado por ilusões divinas, cheques do estado, mais palmadas nas costas
se o preço a pagar é ser impoluto
eu não leio nem quero ler os vossos livros
conhecer as vossas editoras
frequentar os vossos meios
há tanta gente que faz as coisas por amor
e é preciso perder as letras primeiro para as encontrar
por fim revejo o local onde ainda me agrada partilhar
está de volta e eu quero achar uma duas letras
só duas
as mais fáceis de ler
de reler e reescrever
uma língua apenas
a do (des)gosto
pela palavra comum
*
Nota: A foto do cabeçalho pertence ao poeta e foi intitulada Nova linha de poemas sem linha I (2016).
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