Elas andavam frenéticas.
Subiam pelas ondulações do corpo inerte e indefeso. Queriam encontrar morada na deslizante pele alva. Subiam e desciam os imensos obstáculos. Terra inabitada e sem pulsações e fria. Frio era o seio tácito, invadido pelas alpinistas negras. Elas tinham calafrios que subiam pelas patas até as antenas. Queriam saber daquele monte estendido e retorcido, jogado e indefeso. Queriam encontrar a escuridão, lugares cavernosos, sombrios e etéreos. Eram muitas, muitas cabeças e patas pegajosas. O corpo nu jogado na mata começou a se movimentar, lentamente, levados por milhares de formigas, elas buscavam forças descomunais para carregar mais de 50 quilos nas costas. Cambaleavam como bêbadas, não paravam.
Elas começaram a explorar o corpo estranho, entravam pelos buracos labaredas da languidez daquela inexistência. Lá se encontrava, como uma raiz exposta, arrancada da terra árida e rachada pelo sol oxidante, sua luz jogada na pele pintada de branco se fazem sombras almiscaradas pela presença de matos amassados e pisoteados, com um sopro de um raio raivoso o fogo se alastra incansável pelo campo sequioso.
Era um ambiente planalto, de árvores anãs, não passavam de um metro, o fervilhar das labaredas solares refletiam nas cascas lascadas das árvores e nas folhas lisas e de um verde brando que tartamudeia nas imperfeições do local. Como um tratactus lógico-philosophicus, aquela antimatéria evocante da matéria, rodeada de corpos estranhos e velozes, caminhantes milenares percorrendo o planeta entre labirintos espinhosos, consumidos de folhas e raízes profundas de terras lendárias e invisíveis. Tempo e espaço se misturam e fora e dentro desta incompreensibilidade da história destes seres alienígenas. As formigas eram seres faunos atônitos, viviam tocando tambores nas noites frias ao lado das ninfas, somente nas noites opacas e sem estrelas e sem lua. Noites porosas e gementes desciam finas e agudas nas entrâncias dos galhos desérticos, dos matos semimortos e entravam pelas aberturas trincadas do planalto seco, pelas terras arenosas e cobriam com seu tecido as sombras do sol de dores e cócegas nas costas adornadas de lantejoulas e antenas conectadas ao extrauniverso e mirabolantes e caleidoscópicas.
A nudez coubertiana daquela mulher de mamilos amparados de insignificâncias, jogada pela impermeabilidade de sua metempsicose desmoitou a calmaria do ambiente, com seus pelos pubianos esvoaçantes ao sabor de Zéfiro, levou à diapasão as formigas. Ah, os rituais destes seres sugavam as raízes das mandrágoras. Todas ficavam em circunferências após se satisfazerem e se deliciarem com a bebida do diabo. Na noite fria e alcaloide se transformava em gritos e urros e brilhos intensos dos olhos e antenas das formigas. Descontroladas, começaram a subir e descer no corpo da ninfa morta e branca, acreditavam que era uma ninfa, ao rastrear aquela pele lisa e fina como um bisso ou como uma teia de aranha. Tinha um corpo bordado com delicadas linhas.
Inebriadas e encarnadas pela incompletude do devir, começaram a regurgitar sobre o corpo. Alucinadas, despejavam o líquido bebido das raízes das mandrágoras. Aos poucos a ninfa estava toda envolvida com uma nódoa monocolorida e viscosa, que escorria em todas as partes daquele corpo. Ah, blaue blume! Ah, blaue blume! Tudo se desintegrou! Momentos depois do transe, a terra, a noite e todos os seres visíveis e invisíveis se aquietaram e o silêncio se fez. As luzes e as sombras começaram a aparecer e a noite se desfazer. O corpo nu da mulher alva não estava mais lá. Havia uma enorme raiz imergindo, uma raiz de mandrágora. Queria aprofundar-se, rasgar a carne da terra e respirar pelas veias húmus.
As formigas, todas as noites sem sombras, dançavam em redor da mandrágora e sugavam seu suco e gritavam alucinadas para o vácuo da noite.
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