O carrocel é velho e barulhento
Deslizando nos carris oxidados pela chuva
Onde os corpos carcomidos se revelam
Ansiando o brilho do ouro
Rebentando em campos de exequibilidades
De armazenamento de joias
Tesouros feitos ornamentos onde as mensagens ambíguas
Dão origem ao erguer de braços dos déspotas
E ao levantar e baixar da lâmina afiada do carrasco
E a minha mente criando fogo-de-artifício
Falseando os resultados da experiência
Pintando quadros onde a beleza aparece errática
Como trampolim para o grotesco e medonho
A mensagem atinge o alvo onde o alerta é dado
Mas as aranhas inertes e interesseiras
Apenas tecem a sua teia e permitem
Que a probabilidade dos escravos se transforme
Em espaços de concomitância indecente
E é então que o ditador é permitido e o seu ego lunático
Ergue uma forca poderosa
Onde os egoístas conformados passarão o portal
Renascendo como combativo inovador criativo
Golpeando a flecha no coração da besta
Manipuladora de homens esquartejados na cruz
Finalmente a viabilidade do carrasco
Permaneceu do outro lado na invisibilidade
E à velocidade vertiginosa se fez luz
*
Contrato
A liberdade vive calada e surda
Nas entranhas do homem que se vendeu a troco de iguarias
Riqueza podridão de fanatismos e fantasias
A patologia singrou e sangrou os corpos dos criativos
Acorrentaram-se na masmorra mais sombria
E abafando a voz cortaram as mãos
E verteram os sonhos mais gloriosos
No submundo das trevas
Enterraram bem fundo os genes
Das probabilidades em potência
Da vida da celebração
Da ligação fundamental ao cosmos
Onde as moléculas se agitam entre novos seres
Outras vontades renovadas em múltiplos pareceres
*
O pacto caiu em desgaste
Enriqueceu os poderosos os corruptos
Os materialmente ambiciosos
O contrato social permitiu a descrença na humanidade
Fabricou políticos despóticos
Ditadores dissimulados
Explorou as crianças profanou as mulheres
Chicoteou os indefesos e tornou amarga a existência
De quem possui todo o acesso
À partilha da natureza pela essência
O contrato social tornou-se o bilhete para um campo armadilhado
Onde só o assassino é condecorado
E as toupeiras minam o chão que os inocentes pisam
E aos famintos retiram-lhes o pão
A segurança fez pacto com a utopia
Porque o sentir da esperteza saloia da raposa matreira
Derruba os nobres de coração e enaltece os traiçoeiros atrozes
A sandice é inimiga da justiça quando há um tirano
Que se levanta e manipula uma multidão alienada
Que em estado patológico não tem força para o impedir e não faz nada
*
Distanciamento do senso comum
Um mecanismo de evasão é fabricado
Pela consciência inquieta ávida de expansão
O átomo em dança agitada com o vazio penetra o muro
Cria espirais de fortalezas onde se escondem as criaturas do futuro
Na Terra as vibrações se cruzam e os gatos
Captam as auras dos humanos adivinhando-lhes os suspiros os afagos
Os gritos a doce contemplação e os sabores amargos
O lado mecanicista da sociedade cativa o homem como sonâmbulo
Sem objetivo nem propósito sem riso nem pranto
Sobrevém o entorpecimento e cada corpo empertigado
É o centro do seu próprio empreendimento
Aonde não há semelhantes irmãos amigos
Apenas marionetas e arquitetas adorando o obtuso pujante
Distorcido inflamado pedante que desvirtua a estirpe
Que atropela goza e maltrata
E que se permitirem a sua paranoia a todos mata
A caminhada pelos socalcos da serrania faz-se em esforço
O teste de coragem e desafio enleia-se nos pés como trepadeiras
Impedindo a pirueta para além das copas das árvores
Onde a luz é meiga o voo espreita e a paisagem flutua noutra dimensão
E a bravura se faz suavidade para além da brutalidade
Para trás fica a matança a linguarice a multidão opinativa
Sem cérebro sem poder crítico
Então num salto quântico surge o planar rasante dos pirilampos mágicos
Que iluminam os gestos humanos embebidos em utopias
São planaltos abertos onde a energia intuitiva rabisca inovadas melodias
*
A diversificação dos mundos
O masoquismo programado em galhos de bestas
Esquarteja as almas penadas sôfregas de experimentações
A arte trágica mistura-se com a própria vida
A macacaria imita outras formas de contentamento no gemer
E o que acontece como vício torna-se bafo de infrações
Descontroladas pela mente que ergue uma muralha de escravizações
Surge o arrojo planado aproveitando as massas de ar quente
A escavação da terra abrindo luras de escuridão
O rastejante que se abriga da patorra pesada
Prestes a esborrachar o bicho
Para cada criatura um mundo diferente em singular perceção
E eis que surge a criação de labaredas multicolores
No ar no mar no chão
As aselhas dos elementos despertam a deflagração
De complexas orientações
A maré criativa anseia por contorcer as partículas informes
Cativando-as em aparições fantasmagóricas
Assustando os cândidos e espicaçando a diversidade de olhares
Pressente-se uma avaria terrena iminente
As nuvens faíscam em revolta
E os viventes sorvem o contágio da violência
Com o sadismo cuspido no rosto humano
Entre brincadeiras de crianças cruéis sob as saias do profano
*
Ana Maria Oliveira nasceu a 17 de Fevereiro de 1960, em Portugal, no Alto Alentejo no distrito de Portalegre e concelho de Castelo de Vide. Em 1986 finalizou a licenciatura em Filosofia na Faculdade de Ciências sociais e humanas de Lisboa. Licenciatura que lhe permitiu dar aulas de filosofia durante alguns anos. Edita o seu primeiro livro de poesia em 2008 através da Corpos Editora “Grito de liberdade”. Este livro é uma forma de partilhar emoções e vivências, encarando a poesia como uma catarse. Dedica este livro a todas as mulheres, pela luta e determinação com que enfrentam as adversidades de uma sociedade que ainda manipula e escraviza. Faz uma edição de autor “Espírito Guerreiro” o seu segundo livro de poesia, em 2014. Mantem alguns sites onde divulga a sua escrita. Ultimamente mantem-se ligada ao projeto “Filosofia para crianças”. Mantém un site onde divulga a sua escrita:
http://www.devirquantico.blogspot.pt/
Fotografia da autora por José Lorvão.
You might also like
More from Ana Maria Oliveira
5 poemas de Ana Maria Oliveira
Rastos de rebeldia A rebeldia aguçou o espírito os sentidos e alargou perspetivas Enquanto semeava laivos de incongruências fugidias Mas incapaz de se …