Série “Universo dos Falantes // e-book “As mais de 40 histórias do Universo dos Falantes” #euamocriar
O enxerido é um personagem curioso. É cabeçudo, com grandes olhos e orelhas gigantes! O resto é pequeninho.
Chegadiço e assanhado, é um tipo audacioso, que quer saber de tudo: dos ouvidos das paredes que ouvem, da vida dos vermes entediados que se arrastem em lixos e esquinas solitárias, das janelas, portas ou mesmo caixas vazias meio abertas – não deixa de dar uma espiada, nunca – dos buracos hirtos, calados…
E dos bumbuns alheios, então? Ah! Destes, ele é um especialista obstinado – a vida do outro é sua mais sublime especialidade!
Por exemplo, se está trabalhando concentrados e de repente sente uma estranha presença, olhe em volta e vai encontra-lo em algum canto, nem que seja pendurado no teto, olhando para você, com aquele olhão! Levanta rapidamente as duas sobrancelhas malandras, dá uma tchauzinho, e diz com um sorriso maroto e bem desavergonhado, curioso de todo: “Oiii”…
Assim como Jaime Madrox, o “homem-múltiplo”, ele se desdobra em vários. Tem o dom da ubiquidade e, coincidente e curiosamente, está sempre onde a gente está.
Intrometido nas extensões telefônicas, anexos nos e-mails, como fotos em mensagens; podemos encontra-los ao longe olhando pelas fechaduras de porta antigas.
Aparecem do nada, como as fumaças que saem de garrafas, aquelas mesmas que abrigam os gênios das lâmpadas mágicas!
Estamos ouvindo música e quando vemos, ele está lá, como um encosto, entremetido, olhando para você e de novo “Oiiii”!
Vamos sentar num sofá e quase sentamos neles.
Atendemos um celular? Pronto, lá estão eles com seus ouvidos tinindo de lustrosos e bem espichados.
Abrimos a geladeira e lá está o cara oferecido, sorrindo para você com a pergunta: “O que você vai comer?
Pergunta tudo. Quer saber de tudo. Descobre coisas do nada.
Seus olhos são verdadeiros faroletes, acessos e muito abertos.
E, quando achamos que estão quietinhos, finalmente dormindo? … Não estão não…
Introduzidos em todos os momentos, normalmente são atenciosos e adoráveis. Mas, xeretas e oferecidos, no fundo no fundo, não querem mesmo é perder nadica de nada nenhum da vida que é a tua, a do outro, e a de todos os outros!
You might also like
More from Ilustração
«Nunca mais» é a bandeira dum humanismo fulcral | Leandro Lamas & Alfredo J. Ferreiro
As costas de Portugal e da Galiza vêm de ser de novo poluidas até ao paroxismo. O artista Leandro Lamas …
NOVAS VELLAS MARXES: Afra Torrado, multidescendencia do eu | Emma Pedreira
Proxecto Nómades: mostra "Mete coitelo, bota tripas", de Afra Torrado; crítica realizada por Emma Pedreira.