Um poema de resistência
Além do vidro, um ensanguentado rolo de gaze
desvela poesia tecida com arames
vertida do cabo de uma vassoura. Sozinho numa cela, um homem
talvez infligisse o Código Morse na sua coxa, alimentando
uma possível hipótese a outros homens daquele bloco.
Caminho na direcção da lúgubre cela de luliu Maniu´s
no chão, uma amassada malga de alumínio
e uma colher, um balde, um copo.
Uma cama sem colchão,
e um uniforme listrado em dobra no pé.
Numa cela ali está agora A Sala de Poesia-
Crepitação Morse através dos altifalantes,
fotos nas paredes com poemas sem nome:
Morrerei sem saber, sem morrer.
O homem que escreveu poemas em código
foi condenado à morte por tentar
obter assistência médica a um fugitivo
procurado pela Securitate. Onde, quem, porquê?
Penso na minha irmã, noutro continente
—cinco anos na maior prisão Americana
de máxima segurança para Mulheres
por “resistir à prisão com não-violência”,
como uma adolescente. Outros dois anos por
ofensas menores – agora órfã de Mãe
uma Mãe órfã de filha.
Entro na Cela Negra –
uma câmara de tortura. Grilhões amarrados
no chão de cimento. Todos os que lêem
o aviso na porta vão circulando.
Não devem avançar na loucura
(velada) uma loucura em grande escala. Numa prisão para Mulheres
fora de Boston, uma das minhas melhores amigas do liceu
foi atirada para uma solitária durante semanas,
logrou escrever o diagnóstico da loucura de Hamlet
metida num esconso;
iam levando-a ao desespero – a virtude da vontade.
Faz do louco o culpado e perturba a alma livre.
Ninguém me detém quando do quarto saio.
Sob o vergel, uma colina de goivos
cobre uma infame memória.
Entro pela sua porta de cimento.
Uma mesa oval feita de pedra como uma retina;
a sua superfície: água.
Cera de abelha
velas acesas na memória de alguém,
de alguém alguém, uma fâmula
na direcção de uma cruz que se abre no tecto.
Começou a chover.
Dou-me conta que soçobro
num sentimento para além dos limites
da racionalidade. Eu sei sem saber.
Doze velas pequenas alumiam a mesa de água.
Estive aqui tão só
que acendi só metade delas.
Por ninguém em particular.
Para ti, para ti, para ti.
Tara Skurtu. Tradução [Inglês a Português]: Tiago Alves Costa
*
A poem of resistance
Behind the glass, a bloodied roll of gauze
unravels poetry stitched with wires
shed from a broom. Alone in a cell, a man
would slap Morse code onto his thigh, feeding
possibility to the other men in the block.
I walk into Iuliu Maniu’s death cell.
On the floor, a dented aluminum bowl
and spoon, empty bucket, cup.
Cot without a mattress, striped
uniform draped at the foot.
One cell is now The Poetry Room—
Morse crackling through the speakers,
photographs of anonymous wall poems:
I will die without knowing, without dying.
The man who stitched poetry in code
was condemned to death for trying
to get medical attention for a fugitive
wanted by the Securitate. Where, who, why?
I think of my sister, on another continent
—five years in America’s largest
women’s maximum security
for “resisting arrest with nonviolence”
as a teenager. Another two years for
another minor offense—now a motherless
mother with a motherless child.
I enter The Black Cell—really,
a torture room. Shackles anchored
to the stone floor of a shoebox room
without windows. Everyone else who reads
the placard at the door keeps walking.
Madness in great ones must not
(unwatched) go. In a women’s prison
outside Boston, one of my best college
students, thrown into solitary for weeks,
managed to write a paper diagnosing
Hamlet’s madness in a hole
meant to drive her mad—and turned it
in on time. The virtue of will.
Make the mad guilty and appall the free.
No one stops me as I leave the room.
In the courtyard, a grassy hill bearing citrus
covers a domed memorial. I enter
through its concrete door.
A round stone table like a retina;
its surface: water. Beeswax
candles lit in memory of someone,
of someone’s someone, flame
toward an open cross in the ceiling.
It’s starting to rain. Drops taps the table.
I am becoming aware that I might be
falling into a love beyond the limits
of restraint. I know without knowing.
Twelve lit candles light the water table.
I’ve been here alone so long
I’ve lit at least half of them.
For no one in particular.
For you, and you, and you.
{Cfr. Tiago Alves Costa}
You might also like
More from Tara Skurtu
2 poemas de “Amoeba Game” de Tara Skurtu
Tara Skurtu é uma poeta e escritora americana. Duas vezes donatária da Fulbright nos EUA e ganhadora de dois prêmios …