Vamos logo lá com o experimento: vou-vos escrever em galego com formato português, de maneira que não me venhais dizer que não estais avisados. Ninguém se alarme. Todos tranquilos.
E de onde vem a ideia? De mui longe no tempo: ainda que eu chegasse a Lisboa para ficar o dia de São Pedro de 1972, havia tempo que andara a cruzar a fronteira física do Minho (com longas filas e guardinhas interrogantes) e muito mais tempo que vinha lendo livros em português.
Tenho contado que no meu Bacharelato não se ensinava nada de Literatura Portuguesa, só no livro de Literatura de 6º ano se mencionava Eça de Queiroz. Mas tive a sorte de que um colega recebesse duma prima emigrada livros de aventuras brasileiros, alguns deles clássicos. Ler aquilo era como ouvir música divina: soava a língua galega depurada, moderna, posta ao dia.
Um amigo corunhês, filho de bibliófilo, roubou-lhe ao pai (perdão: tomou-lhe emprestado para nunca devolver) A Relíquia de Eça. Deu-mo (peço desculpa de novo: emprestou-mo para nunca o entregar de volta) e aí começou a minha paixão. Eça foi seguido por todo o que caía nas minhas mãos ávidas de Letras Portuguesas: Aquilino Ribeiro, Alves Redol, Fernando Namora…
Cheguei a Lisboa, a trabalhar no meu, a Electrónica de Comutação, e tive a sorte de que o meu chefe –o Mário Salema– fosse filho do editor de Seara Nova, a revista que resistia contra o salazarismo, já na altura caetanismo. Não preciso dizer por que caminhos ia discorrer aquele encontro definitivo com a portuguesidade. Uma vez mais na minha vida a profissão enfiou-me na cultura literária. Ao Salema também lhe devo grave advertência de amigo: “Rapaz, não fales muito, que alguém de nós é da PIDE…”
Um deve ser agradecido para demonstrar que é bem nascido. Dos mil amigos que fiz logo ao pouco de andar por Lisboa salienta um, a quem me enviara Ramón Pinheiro com carta de apresentação: o doutor (em Leis) Pedro Cabo Fernández, administrador da SONAP, a empresa dos petróleos, que me abriu os braços da galeguidade velha na capital portuguesa (seu bisavô já fora o “descobridor” do vinho verde para os alfacinhas).
Com o Pedro aprendi coisas da Galiza que no Impaís ninguém se atrevia a falar. Por exemplo, o necessitados (de dinheiro e agarimo) que estavam os persoeiros galegos. Vede aí nessa foto como Otero (Outeiro) Pedrayo (Pedraio?) se deixava querer pelo Pedro Cabo, representante do Centro Galego da Rua da Madalena.
[Seguiremos a baralhar]
You might also like
More from Crónicas
XIIº Encontro de Escritores de Língua Portuguesa
Entre os dias 5 e 8 de setembro tive a honra de representar a Galiza em Cabo Verde no XIIº …
Primeira Crónica desde Xai Xai: a chegada
Participação de poetas da Galiza no VII Festival Internacional de Poesia de Xai-Xai, Gaza, Moçambique Primeira Crónica desde Xai Xai: a …