DescobriMENTOS
O que são os DescobriMENTOS
Os DescobriMENTOS são uma marca de pastilhas fabricada pela empresa portuguesa GHGF (Grandes Homens, Grandes Feitos). Cada embalagem contém setenta e uma pastilhas.
Para além do sabor original (Mentha Spicata), a marca, distribuída pelo continente e ilhas, criou recentemente outros sabores. Entre eles: Citrus Aurantius, Malum Persicum ou I’ba-ka’ti. Todos inventados pelos portugueses no século XVI.
Como usar os DescobriMENTOS
Abra a embalagem, selecione uma pastilha, chupe.
Para todas as idades.
COCAS PARADOXAL
O que é o COCAS PARADOXAL
O COCAS PARADOXAL ou o QUANTOS-PARADOXOS-QUERES é um jogo inspirado no jogo tradicional Cocas ou Quantos-Queres e na quantidade volumosa, realmente abundante, de paradoxos criados ou manifestados por nacionalistas e intelectuais portugueses, descendentes dos grandes descobridores.
O COCAS PARADOXAL funciona como o Cocas tradicional. Cada número do COCAS PARADOXAL corresponde a um paradoxo.
1 — “Sou português e nacionalista. Tenho muito orgulho do meu país e da nossa História. Em que República estamos?”
2 — “É um facto: o homicida proferiu vários comentários racistas antes de assassinar o indivíduo, que era negro, mas parece-me extremista dizer que isto se trata de um crime racista”.
3 — “A concepção colonial portuguesa do mundo pertence ao nosso grandioso passado”.
4 — “Apesar de o crime ser evidentemente racista, a questão não reside aí. E vou explicar-vos agora por que razões [lista de razões desconectadas com o crime e exclusivamente relacionadas com a experiência do sujeito da enunciação que, obviamente, não é negro]”.
5 — “Sou português, logo sou branco”.
6 — “A exploração colonial portuguesa, antiga e tardia, era harmoniosa e agradável, apesar de todo o sistema assentar na disposição e divisão hierárquica e legalmente prescrita das três raças: portugueses, indígenas e negros”.
7 — “O colonialismo benigno dos anos 60”.
8 — “A luta antirracista e a luta anticolonial são as responsáveis pela ascensão da extrema-direita racista e colonial”.
9 — “A urgência dos trabalhos forçados infligidos pelos portugueses nas comunidades indígena e negra é coerente com as necessidades da sua época, porque o seu propósito era civilizacional”.
10 — “Volta p’ra tua terra”.
Como usar o COCAS PARADOXAL
1. Associe a cada um dos números um paradoxo.
2. Enquanto segura o COCAS PARADOXAL, pergunte ao seu amigo:
— QUANTOS QUERES?
3. Abra e feche o COCAS PARADOXAL de acordo com o número que o seu amigo escolher.
4. Leia, em voz alta, o paradoxo para o seu amigo.
5. Discuta com o seu amigo o(s) significado(s) do paradoxo.
6. Entregue o COCAS PARADOXAL ao seu amigo.
7. O seu amigo deverá repetir o mesmo processo.
8. Poderá também jogar ao COCAS PARADOXAL com mais de um amigo.
Para todas as idades a partir dos 6 anos.
BANQUINHO RACIAL
O que é o BANQUINHO RACIAL
O BANQUINHO RACIAL é uma peça de mobiliário colonial e a base de um exercício fundamentalmente psicológico.
O BANQUINHO RACIAL deve ser usado na eventualidade de cruzar-se com um ou mais membros das comunidades das ex-colónias portuguesas.
Como usar o BANQUINHO RACIAL
1. Ao cruzar-se com um ou mais membros das comunidades das ex-colónias portuguesas, posicione o banquinho e suba para cima dele.
2. Desça do banquinho assim que o contacto com um ou mais membros das comunidades das ex-colónias portuguesas terminar.
Não se recomenda o uso do banquinho racial em situações de contacto com um ou mais membros dos países do norte.
Para todas as idades.
ELIXIR
REVELAÇÃO DIVINA
O que é o ELIXIR REVELAÇÃO DIVINA
O ELIXIR REVELAÇÃO DIVINA é uma preparação líquida dissolvida em álcool com substâncias aromáticas, medicamentosas e terapêuticas.
Inspirado na versão de Eusébio de Cesareia, o ELIXIR REVELAÇÃO DIVINA recupera e materializa, além do famoso Milagre de Ourique, outra narrativa cara à grande cultura portuguesa. Conta Cesareia que, a 28 de Outubro de 312, um pouco antes da Batalha da Ponte Mílvia, o imperador Constantino Magno viu uma cruz acima do sol. A imagem da cruz, formada pelas duas primeiras letras gregas do nome de Cristo, Chi e Rho (ver logótipo do ELIXIR REVELAÇÃO DIVINA), foi mais tarde associada à frase latina que Deus terá dito a Constantino Magno, “In hoc signo vinces”, do grego ἐν τούτῳ νίκα (en touto nika), que, em português, significa “com este sinal vencerás”. A frase foi, além disso, pintada nos escudos dos soldados de Constantino i que, depois de receber este sinal altíssimo, venceu esmagadoramente o inimigo.
Foi na versão de Cesareia, que inspiraria também a estória do milagre de Tolbiac, que, entre muitos outros homens valorosos, o talentoso poeta português Luís de Camões se inspirou para escrever sobre o conhecido “Milagre de Ourique”: “Quando na cruz, o filho de Maria,/ Amostrando-se a Affonso o animava” (estância 45, Canto III, Os Lusíadas).
A vitória dos cristãos sobre os mouros revelou-se tão absoluta que foi dela que D. Afonso Henriques partiu para autoproclamar-se Rei de Portugal.
A autoproclamação, que marca o início da independência do reino de Portugal, anteciparia também o começo de uma dinâmica autoproclamativa colonialista de dimensão celestial: “Aos infiéis, Senhor, aos infiéis,/ E não a mi, que creio o que podeis’”.
O ELIXIR REVELAÇÃO DIVINA proporcionar-lhe-á as mais variadas alucinações de extensão célica.
Como usar o ELIXIR REVELAÇÃO DIVINA
1. Beba o ELIXIR REVELAÇÃO DIVINA em dias mais tensos.
2. Beba o ELIXIR REVELAÇÃO DIVINA num lugar confortável e privado, como a sua casa, garagem ou escritório.
Recomendado para todas as idades a partir dos 18 anos.
COLÓNIA
O que é a COLÓNIA
A COLÓNIA é a versão colonial portuguesa do Monopólio. Capaz de destruir as melhores amizades e ser efetivamente a origem de brigas acesas entre os participantes, a COLÓNIA continua a ser jogada por milhões de pessoas em Portugal e outros lugares.
O objetivo do jogo consiste em reconstruir o império geográfico, religioso e espiritual português e evitar a perda dos territórios. Ao contrário do Monopólio, não há perdedores.
A COLÓNIA é um jogo de vencedores.
A duração do jogo depende inteiramente do grau da dedicação dos participantes.
Como jogar a COLÓNIA
1. Estabeleça a ordem das jogadas dos participantes a partir do sentido dos ponteiros do relógio.
2. Ao contrário do Monopólio, a COLÓNIA não inclui dados. Cada participante decide quantos territórios pretende avançar.
3. Depois de avançar X territórios e parar num território à sua escolha, o jogador deve gritar bem alto:
É MEU!
4. O jogo termina quando todos os territórios estiverem sob o domínio dos participantes.
Para todas as idades a partir dos 5 anos.
MANUAL DA LÍNGUA DE CAMÕES
O MANUAL DA LÍNGUA DE CAMÕES é um livrinho fundamental. Foi feito para todos os nativos do Português com o objetivo de cimentar um entendimento extenso e correto da Língua Portuguesa.
As pequenas incongruências do dia a dia ou até mesmo os períodos em que a sua produção diminui representam um desafio para manter uma conduta linguística perfeita. Deste modo, é muito importante manter-se por dentro das regras e convenções do nosso idioma.
Outro dos problemas é a liberdade e imenso perfil criativo com que as comunidades das ex-colónias portuguesas parecem encarar a Língua Portuguesa.
Apesar de todos os países terem como língua oficial a portuguesa, o facto é que, por exemplo, os brasileiros incorporaram à língua de Camões algumas diferenças (muitas vezes provenientes dos autóctones ou outros colonizadores), nem sempre vistas com bons olhos pelos portugueses.
Por isso, alguns imigrantes brasileiros em Portugal referem já ter ouvido, de professores universitários, que o português que falam não é o correto.
Se estes imigrantes — e isto aplica-se, também, aos angolanos, moçambicanos ou cabo-verdianos — escolheram ir para Portugal devem fazer um esforço para se adaptarem à grande língua que lá é falada.
Como se sabe, em Portugal desaguaram todas as migrações europeias e a História de séculos de contactos e colonização em mais de dois continentes. E, até pelas suas responsabilidades europeias e mundiais, Portugal não deve desviar-se do seu futuro alado em nome de uma suposta generosidade.
Como usar o MANUAL DA LÍNGUA DE CAMÕES
1. O MANUAL DA LÍNGUA DE CAMÕES é composto por 20 capítulos.
Capítulo 1: “A minha pátria é a Língua Portuguesa”
Capítulo 2: “Como endireitar o seu sotaque em 10 dias”
Capítulo 3: “É frigorífico, não geladeira!”
Capítulo 4: “A boa e velha ortografia”
Capítulo 5: “Acentuação gráfica”
Capítulo 6: “Colocação pronominal”
Capítulo 7: “Concordância entre predicado e sujeito”
Capítulo 8: “O pronome Você”
Capítulo 9: “Essa coisa maravilhosa que é o Vós”
Capítulo 10: “Pronomes de tratamento”
Capítulo 11: “Eufemismo e hipérbole”
Capítulo 12: “Casos de emprego da crase”
Capítulo 13: “Como evitar certos trejeitos”
Capítulo 14: “Barbarismo, cacófato, solecismo”
Capítulo 15: “Orações subordinadas”
Capítulo 16: “Orações subordinadas adverbiais”
Capítulo 17: “Essa coisa maravilhosa que é o Pá”
Capítulo 18: “Essa coisa maravilhosa que é o Pois”
Capítulo 19: “Não se escreve como se fala”
Capítulo 20: “Como usar o infinitivo”
2. Como todos os portugueses dominam indubitavelmente o conteúdo dos 20 capítulos, ofereça o MANUAL DA LÍNGUA DE CAMÕES aos membros das comunidades das ex-colónias.
3. Insista, além do mais, no facto de o MANUAL DA LÍNGUA DE CAMÕES dever ser passado de pais para filhos.
4. Idealmente, o(s) membro(s) da comunidade da ex-colónia deverão receber o MANUAL DA LÍNGUA DE CAMÕES nos primeiros anos de vida.
Para todas as idades a partir dos 6 anos.
SAUDOMASOQUISMO
O que é o SAUDOMASOQUISMO
O SAUDOMASOQUISMO é um chicote e uma das extensões possíveis de dois conceitos caros à cultura portuguesa e, de resto, intraduzíveis: o saudosismo e a saudade.
O saudosismo, que carrega em si a ideia de renovar e regenerar a nação portuguesa, assenta estética e literariamente no sentimento da saudade.
O primeiro, cunhado por Teixeira de Pascoaes, e a segunda, pertencente ao senso comum, partem da admiração e afeto excessivos por aspectos ou episódios do passado.
O saudosismo parte, por sua vez, de um princípio de esforço coletivo nacionalista.
O SAUDOMASOQUISMO materializa a bem conhecida expressão “matar a saudade” e tem como objetivo duplo conservar e, ao mesmo tempo, expurgar a nostalgia.
É um exercício contraditoriamente saudável e patriótico.
Como usar o SAUDOMASOQUISMO
1. A interpretação metafórica ou literal do SAUDOMASOQUISMO fica inteiramente ao seu critério.
Para todas as idades a partir dos 18 anos.
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Patrícia Lino (Portugal, 1990) é poeta e professora de literaturas e cinema luso-brasileiros na UCLA. Lino é a autora de O Kit de Sobrevivência do Descobridor Português no Mundo Anticolonial (2020), Não é isto um livro (2020) e Manoel de Barros e A Poesia Cínica (2019). Dirigiu recentemente Anticorpo. Uma Paródia do Império Risível (EUA 2019; Brasil 2020) e Vibrant Hands (2019). Lançou também o álbum de poesia mixada I Who Cannot Sing (2020). Lino apresentou, publicou e expôs ensaios, poemas e ilustrações em mais de seis países. Foi uma das poetas portuguesas convidadas a participar na Feria del Libro de Bogotá e na Fiesta del Libro y la Cultura de 2020. A sua investigação centra-se na poesia contemporânea, culturas visual e audiovisual, paródia, anticolonialismo e cinema brasileiro. É membro integrado do UCLA Latin American Institute, colaboradora do Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa e co-editora da revista brasileira de poesia e crítica escamandro. http://patricialino.com
Estes 7 objectos fazem parte do livro O Kit de Sobrevivência do Descobridor Português no Mundo Anticolonial (2020). Editado no Brasil pela Macondo Editora e em Portugal pela Douda Correria.
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