Há umas semanas, o presidente da Irreal Academia Galega, professor Jesus Alonso Montero, concedia entrevista na V Televisión. Nela falava do drama da língua galega, além de aproveitar o momento para disparar torpedos à moral do seu antecessor na presidência desse clube de membros do establishment, o também professor emérito Méndez Ferrim.
É curioso que um marxista internacionalista como o Sr. Alonso passasse toda a vida a preocupar-se por uma língua contra a que fizeram todo o possível os seus colegas comunistas. Velho é o seu Informe dramático no que adiantou a morte da fala que talvez lhe servira a ele de pequeninho para aprender a comunicar-se com a gente. O que o professor Alonso —formado em Letras e desinteressado das Ciências— não pôde pensar na altura do seu dramático informe é que os meios de comunicação fossem avançar de forma a facilitarem a manutenção das línguas “menores”. Como ia ele imaginar uma Companhia de Radiotelevisão da Galiza nem a Internet, a web, a telefonia celular, os sistemas integrados a nível 4G… já a caminho do 5G?
Bem, o fato é que na entrevista de referência, a nossa personagem —qualificável como “peculiar” em termos de prudência— dizia duas grandes verdades a respeito do desastre do galego, e ocultava outras duas, nas que ele tem mesmo culpa. Vamos logo com elas:
Certo, certíssimo, dom Jesus, que a responsabilidade maior da desaparição do galego da boca dos rapazes é que os avôs e os pais deixam de transmiti-lo; também que a língua dos poetas do Impaís segue a levar o estigma da pobreza, enquanto o catalão se associa na Catalunha com a riqueza e o poder (vá-se, por exemplo, ao Clube de Polo de Barcelona e escute-se em que falam os polistas. Na Galiza não há golfista que deixe de “madrilenhear”).
Também é muito acertada a crítica sobre o uso do galego a micro aberto ou fechado. Tal comportamento ruim dos políticos não nacionalistas, nomeadamente os centralistas do PSOE e do PP (como fizeram os comunistas: lembre-se, dom Jesus), é ainda mais grave no caso dos apresentadores e locutores da CRTVG. Quem isto escreve, nos seus tempos de diretor técnico dessa companhia, somou ódios de muitos “artistas do entertainment” por um simples razoamento: “Se vocês não praticarem continuamente a sua língua de trabalho, logo vão cair facilmente em erro a micro aberto”.
Sim, a gente conhece este dúplice comportamento e interioriza a falsidade dos que hoje exprimem ideias em neocastrapo (quantos políticos ou locutores falam já galego?) sob as lâmpadas do platô para passarem ao castelhano tão logo veem extinta a luz vermelha do tally. Isso resta valor às prédicas a favor do galego.
Mas há algo que atinge severamente o Professor Alonso Montero e tem a ver com a figura do Dia das Letras Galegas que defendia na entrevista à V Televisión. Quiçá seja a nossa diferença de idade que faz com que a minha memória ainda esteja fresca para certos assuntos (ou, também, que me obrigasse a exercitá-la a condição de professor de matérias muito relacionadas com ela). O certo é que lembro a batalha entre enxebristas e integracionistas quando Galiza chegou ao momento de escolher forma oficial da sua língua.
De que lado estava então o marxista Alonso? Do mesmo em que lutavam o Filgueira Valverde e o Asturianim da Pipa: no dos incapazes de entenderem quanto outros —que viajávamos e mesmo vivêramos ao sul do Minho— levávamos anos a compreender. A vossa cegueira deixou o galego a posição que desejava Madrid: com aparência de dialeto, ao nível do bable ou do aragonês…
Agora, dom Jesus, não se me vá por aí esquecendo o seu erro histórico. Imagine, pela contra, a grafia do galego diretamente ligada com a do português, segundo marca a documentação histórica. Que teriam feito os seus admirados catalães se a origem do idioma do Estado Francês estivesse nos Països Levantinos? Acredita que usariam a grafia de Madrid ou a de Paris? É preciso que lhe recorde o que ouço e vejo na Flandres? Por que pensa os flamengos escrevem como os holandeses, falando de maneira só parecida?
E vou terminado, senhor marxista: vocês, membros da Academia de Maioritariamente Incompetentes em Matéria Linguística (quantos dos que aquecem poltrona na casona corunhesa sabem de línguas?), também formam parte da sociedade e devem dar-lhe exemplo.
O professor Henrique Monteagudo conhece do que sabemos os profissionais da telemática sobre idiomas humanos, linguagens de máquina e as suas relações. Por isso me entendo com ele e trocamos mensagens. Uma que há pouco me mandou é que, finalmente!, a Tartarúguica Academia vai editar um dicionário de apelidos galegos (no que se verá como o segundo de Monteagudo, Romero, deveria ser Romeu). Bem-vindo dicionário, tão esperado pelos que consideramos os nomes de família como “cultura concentrada”.
No entanto, por que não começam vocês a corrigir os vossos apelidos como fez o Vítor Fernández Freixanes? No caso do Sr. Presidente a incoerência é suprema: acusa de incoerentes os políticos como o Feikhó ou o Rakhoy e não vê que os seus apelidos, se forem galegos (como hão de sê-lo, do Ribeiro de Avia), deveriam passar a Afonso e Monteiro. Ou logo não é assim?
Enfim, dom Jesus: menos disparar –com focos e micro— ao também enxebrista e antilusista Ferrim, menos passar responsabilidades ao povo e mais consciência de povo, que povo somos todos, os que acreditam e os que não acreditamos em Marx e as suas barbas (semelhantes às que lhe pintavam a Deus antes de que o feminismo se revelasse contra o divino machismo).
NOTA: a fotografia do início provém da Wikipedia galega.
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