João Rasteiro (Coimbra, Portugal, 1965), poeta e ensaísta, traduziu para português vários poemas de Harold Alvarado Tenorio, Miro Villar, Juan Armando Rojas Joo, Juan Carlos García Hoyuelos, Enrique Villagrasa e Antonio Colinas. É Licenciado em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Universidade de Coimbra. Possui poemas publicados em várias revistas e antologias em Portugal, Brasil, Moçambique, Itália, Espanha, Finlândia, República Checa, Colômbia, México e Chile e vários poemas traduzidos para o Inglês, Francês, Espanhol, Italiano, Catalão, Checo e Japonês. Obteve vários prémios, nomeadamente a “Segnalazione di Merito” do “Concurso Internacional Publio Virgilio Marone”, Itália, 2003, e o “Prémio Literário Manuel António Pina”, 2010. Em 2012 foi um dos 20 finalistas (poesia) do Prémio Portugal Telecom de Literatura. Publicou os seguintes livros: “A Respiração das Vértebras” (Sagesse, 2001), “No Centro do Arco” (Palimage, 2003), “Os Cílios Maternos” (Palimage, 2005), “O Búzio de Istambul” (Palimage, 2008), “Pedro e Inês ou As madrugadas esculpidas” (Apenas, 2009), “Diacrítico” (Labirinto, 2010), “A Divina Pestilência” (Assírio e Alvim, 2011), “Tríptico da Súplica” (Escrituras, 2011, Brasil), “Elegias” (Debout Sur L´Oeuf, 2011), “Pequena Antologia da Encenação – 2001/2013: Poemas em ponto de osso” (Lastura, 2014, Madrid), “Salamanca o la Memoria del Minotauro” (Palimage, 2014) e “Solstício de Dezembro” (Edição restrita de autor, numerada e assinada pelos autores, com texto de João Rasteiro e aguarelas originais de Seixas Peixoto, 2014). Em 2008 integrou a antologia e exposição internacional de surrealismo “O Reverso do Olhar”. Em 2009 integrou a antologia: “Portuguesia: Minas entre os povos da mesma língua – antropologia de uma poética”, organizada pelo poeta brasileiro Wilmar Silva e que engloba poéticas de Portugal, Brasil, Cabo Verde e Guiné-Bissau. Em 2009 integrou o livro de ensaios “O que é a poesia?”, organizado pelo brasileiro Edson Cruz. Em 2010 integrou a antologia “Poesia do Mundo VI”, resultante dos VI Encontros Internacionais de Poetas de Coimbra organizados pelo Grupo de Estudos Anglo-Americanos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Em 2011 integrou o livro “Três Poetas Portugueses” (Brasil), organizado pelo poeta brasileiro Álvaro Alves de Faria. Em 2012 integrou a antologia de poesia portuguesa contemporânea “Corté la naranja en dos“, (México) com compilação e tradução de Fernando Reyes, da Universidade Nacional Autónoma do México. Em 2009, organizou para a revista “Arquitrave” da Colômbia, uma antologia de poesia portuguesa, intitulada “A Poesia Portuguesa Hoje”. Em 2012 participou na exposição “Surrealism in 2012” do Goggleworks Center for the Arts, Reading, EUA, com trabalhos individuais e colectivos, executados com os membros do “Cabo Mondego Section of Portuguese Surrealism”, que integra desde a sua fundação em 2008. Para sua felicidade e alívio ainda não se sente poeta. [rasteiro.j@gmail.com]
1.
Deixou-se que os deuses
criassem o seu deus: o homem
com seus dentes negros solidificando
o osso súbito
por entre a cerejeira em flor,
as têmporas do mundo faiscando
sua convulsão na breve claridade.
2.
Veio o amor amando amor, crueldade.
Paixão e espinho:
uma luz, um paradoxo, um brejo lívido,
a mão violenta e esguia
como a primavera nas entranhas da rosa,
um sopro cortado como a neve,
rio de sangue, sobre rio,
túnica, corpo sobre corpo,
esférulas de túnica erguendo-se aturdidas
sob a defenestração dos céus.
3.
Uma oração não é um perfeito
amor-perfeito, em seu óbelo
uma oração nunca é um amor-perfeito,
assim é a impiedade a seu tempo.
E tudo assim sobrevirá, em tempos
de olvido, a boca do pecado é sublime
entre a dobra sagrada do nódulo.
4.
– Purificai as águas,
que se morre de mágoas. Rosas,
o corpo amputado. O amor
tomou-o por si como tributo.
Estendei a vossa cegueira
contra a minha crença e exalai a luz
no âmago do âmago,
e suportai quando eu exalar sobre ela.
A minha paixão é que assestem
o sustento no vosso próprio osso.
5.
E a noite não cedeu à poesia.
E é este o momento decisivo, inelutável,
o anelo branco que transporta
no dorso o peso do homem. Deixe-se
que os abolidos alimentem os abolidos,
as suas flores mortas,
seres despidos, criaturas sufocadas
em lírios brancos, anjos sob cal.
“O deserto está perto. Sempre. Mas
o deserto é fértil” – unifloro e branco
como a dual boca da noite.
João Rasteiro
(In, acrónimo, 2014 – inédito)
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