DAUDE DE PRADAS (…1214-1282…): Amors m’envida e.m somô (tradução de Graça Videira Lopes)
Amors m’envida e·m somô qu’iéu chant e faça a saber cossi·m ten Amors en poder, ó si m’es trop mala ó no; e póis vei que·s ilh m’en apela, e·lh sazôs qu’adés renovela, ben es dreitz qu’en chantan retraia cossi·m conorta e m’apaia uns jóis qui s’es en mon cór mes, per bon respiéch que m’a conquês. De totz los bens qu’en Amor sô, ai iéu ara qualque plazer, car iéu ai mes tot mon esper, mon pensar e m’entenciô en amar domna coinda e bela, e soi amatz d’una piucela, e quan trob sóudadeira gaia, deporte mi cossi que·m plaia; e per tant non son menhs cortês ad Amor si la part en três. Amors vol ben que per razô éu am midon per mais valer; et am piucela per tener e sobre tot que·m sia bo s’ab toseta de prima sela, quand es frescheta e novela, don no·m cal temer que já∙m traia, m’aizine tant que ab liéis jaia un sér ó dôs de mês en mês, per pagar ad Amor lo cês. Non sap de domnei pauc ni pro qui del tot vol sidons aver; non es domneis póis torn’a ver, ni cors s’i ren per guizerdô. Aia·n hom anel o cordela, e cug n’ésser reis de Castela! Pro es domneis d’amor veraia, si jóias pren e, quan pot, baia; e·l sobreplus tenha Mercês en tesaur, e no·n done ges. Franca piucela de sazô mi platz, quand m’es de bel parer, e·s vai de josta mi sezer, quan sui vengutz en sa maisô; e si·l vuolh baisar la maissela ó·lh estrenh un pauc la mamela, no·is móu ni·s vira ni s’esglaia, anz ponha cum vas mi s’atraia, tro que·l baisars en sia pres e·l doutz tocars de luoc devês. De sóudadeira coind’e pro vuolh que·m don, ab pauc de querer, tot çó qu’Amors vol a jazer, e non faça plag ni tençô d’ostar camisa ni gonela, anz dance segon que·l viela cel que non a sonh que s’estraia de far tot joc qu’Amors l’atraia; e s’ilh n’avia mais aprês, já de l’ensenhar no·is feissês. |
O Amor me convida e me insta a que cante e faça saber como me tem em seu poder, e se me faz muito mal ou não; e pois vejo que ele assim me chama, e que a estação ora se renova, é justo que cantando conte como me conforta e sossega uma alegria que no coração me entrou pela boa esperança que me conquistou. De todos os bens que no Amor há, recebo eu agora algum prazer: pois pus toda a minha esperança, o meu pensar e a minha intenção em amar dama graciosa e bela, e sou amado por uma donzela, e quando encontro soldadeira alegre divirto-me tanto quanto me apraz; e por isto não sou menos cortês para o Amor, se o parto em três. Amor bem quer que, com razão, eu ame minha senhora, para mais valer, e ame donzela para a ter, e sobretudo que me saiba bem se, com mocita de primeira sela, quando é fresquinha e nova, e de quem não devo temer que me traia, me arranjo tão bem que com ela me deite uma noite ou duas de mês a mês, para pagar ao Amor seu tributo. Não sabe de galanteria coisa nenhuma quem da sua senhora tudo quer ter. Não é galanteria se passa a ser verdade, ou o corpo é dado por galardão. Tenha um homem um anel ou um cordão e cuide com isso ser rei de Castela! Galanteria é, e de amor verdadeiro, se prendas recebe e, quando pode, beija; o resto tenha-o a piedade como um tesouro e não o dê. Franca donzela na idade certa me apraz, quando é de bom parecer e se vai ao pé de mim sentar quando chego à sua morada; e se lhe quero beijar a bochecha ou lhe aperto um pouco a maminha, não se move, nem se vira ou assusta, antes procura chegar-se a mim, até que o beijo seja dado e o doce tocar do lugar vedado. De soldadeira graciosa e boa quero que me dê, sem muito pedir, tudo o que o Amor quer do deitar, e que não faça preito nem discussão de tirar a camisa e a gonela, mas antes dance segundo o som da viola daquele que não cuida renunciar a fazer todos os jogos que o Amor lhe traga; e se tiver ela aprendido mais algum, que em ensiná-lo não seja avara. |
#Daude de Pradas#Graça Videira#poesia#poesia medieval#poesia medieval galego-portuguesa#poesia provençal
You might also like
More from Graça Videira Lopes
Do canto à escrita: novas questões em torno da Lírica Galego-Portuguesa – Nos cem anos do Pergaminho Vindel, por Graça Videira Lopes
Do canto à escrita: novas questões em torno da Lírica Galego-Portuguesa – Nos cem anos do Pergaminho Vindel, Graça Videira …
Branco e vermelho (XX): breve nota sobre a poesia provençal
Entre finais do século XI e princípios do século XII, na região que corresponde hoje ao sul e sudoeste de …